Por Rose Gomes
Parece
que foi ontem que uma das bandas mais celebradas – e uma das maiores em
atividade – lançou aquele que seria um de seus trabalhos mais ousados e
criativos e até mesmo exóticos, como Paul McGuinness, empresário do U2
classificou certa vez.
Gerado
durante a turnê mais megalomaníaca da banda, a Zoo TV Tour, cheia de
personagens e regada de alta tecnologia, Zooropa - nome criado à partir da
junção dos nomes Zoo TV tour, Zoo Station e Europa – foi lançado em 5 de
julho de 1993 trazendo sérias criticas à mídia e tecnologia em geral.
Na capa
(uma das mais belas da banda,) um curioso esboço que mistura resquícios da
bandeira europeia a um cosmonauta, conhecidos por muitos fãs como “Baby Zoo”.
No fundo imagens tremidas e distorcidas que incluem figuras conhecidas como
Lenin, Benito Mussolini e Nicolae Ceauşescu, quase imperceptíveis por serem
encobertos por um roxo obscuro textual.
Entre
as 10 faixas de Zooropa o quarteto passeia pelo alto grau de experimentações
que variam entre o rock alternativo e a música eletrônica, passando por diversos
efeitos sonoros que haviam sido usados previamente em seu álbum anterior,
Acthung Baby de 1991.
“O Edge ainda
estava explorando a cultura dance, hip-hop, mixagens, todo tipo de coisa. Ele
estava experimentando e o U2 era a sua cobaia.” - Larry Mullen Jr (U2 by U2)
O disco abre com a faixa-título ,
a hipnotizante e inebriante ‘Zooropa’, que traz diversos efeitos poderosos de The Edge na
guitarra com vozes ao fundo que perguntam: “O que você quer?”, seguidos de vários
slogans publicitários de marcas conhecidas como "Better by Design"
(Toshiba), "Vorsprung durch technik" (Audi), “A Bluer Kind of White”
(sabão em pó Persil) entre muitos outros citados. Uma crítica ao capitalismo ferrenho pelo qual o mundo passava no início dos anos 90, sendo apelidada como “faixa
de manifesto” por Bono.
Babyface, a poética e aparentemente ingênua canção traz
letra extremamente sensual e batida envolvente, enquanto que Numb apresenta um
Edge brochado e entediado com a programação da TV e tudo o que a mídia lhe
impõe. O instrumental de Numb é sem duvida um dos grandes destaques deste
disco, trazendo mais uma vez os efeitos sonoros à tona. “Numb mostra a sensação de que
você está sendo bombardeado por tanta informação que você se acha completamente
desligado e incapaz de responder”, contou
o guitarrista no livro U2 by U2.
Lemon, a música mais ‘polêmica’,
odiada por pseudo-fãs que acreditam que a partir desta canção a banda resolveu virar
a casaca, talvez pelo falsete (citado como voz de fat lady) adotado por Bono.
Pura balela. Numa tentativa de manter viva a lembrança de sua falecida
mãe,Iris, o vocalista escreveu a canção inspirada em um vídeo antigo no qual
sua progenitora aparece como dama de honra em um casamento, usando um vestido
cor de limão. “Era um casamento, onde ela era a dama de
honra vestida em um lindo vestido cor de limão. Eu cantei com a minha voz de Fat Lady, mas havia uma aspereza na
letra.”
O destaque instrumental é
evidenciado com clareza pelo baixo harmonizado totalmente com a batera. Ponto
para a dupla Adam & Larry.
Chegamos à faixa mais bonita do
disco e uma das melhores canções da banda, a doce e cinzenta Stay (Faraway, So
Close!), que aborda a banalidade imposta pela tecnologia e como ela distancia
as pessoas, ao mesmo tempo que inspirado pela história que o cineasta alemão Wim
Wenders estava produzindo à época “Farway, So Close!” versa sobre anjos, numa
interpretação comovente. Vale lembrar que Stay entrou para a trilha sonora do
filme.
A batida dançante de Daddy’s
Gonna Pay For Your Crashed Car vem a seguir nos remetendo à figura carismática
do Mr. MacPhisto, diabo carismático criado na turnê da Zoo Tv que interpretava
esta faixa magnificamente.
Adam Clayton mais uma vez se
destaca com grande êxito com sua linha de baixo marcante na swuingada Some Days
Are Better Than Others preparando o terreno para a bela e singela The First Time, música de
uma simplicidade extrema que traz a história do filho pródigo que não retorna.
Mais uma música da banda que aborda a religião. “É sobre perder a sua fé. Eu não tinha perdido a minha fé, mas eu era
muito simpatizante com as pessoas que tinham a coragem de não acreditar. Eu vi
várias pessoas perto de mim terem experiências ruins com a religião, sendo tão
maltratados que eles sentiram que não podiam mais ir lá, o que é uma vergonha”,
completa Bono.
O que a melodia harmoniosa e
sombria de Dirty Day conta tem muito do pai do vocalista,Bob, mesmo não sendo
escrita para ele. “It´s a dirty day`
(É um dia sujo), era uma expressão que o meu pai costumava usar e tem muito
dele nessa música, mas também foi influenciada pelo Charles Bukowski, o grande
escritor americano e bebedor. Não é
sobre o meu pai, mas eu uso algumas das atitudes do meu pai nessa música.”
Zooropa fecha com a arrepiante
interpretação da lenda Johny Cash à canção The Wanderer, escrita especialmente
para que ele a cantasse. “Nós escrevemos
uma música e o persuadimos a vir e cantá-la conosco, para fechar o álbum, ‘The
Wanderer’. Ame o seu trabalho. É sobre
isso. É muito bom amar o que você faz. Eu acho que ainda há muita coisa para se
alcançar.” O vocalista classifica a canção como o “antídoto para o
manifesto de insegurança de Zooropa".
Zooropa rendeu à banda o curioso Grammy de "Melhor Álbum de Música Alternativa" em 1994. |
Quando ouço Zooropa tenho a sensação de que o U2 experimentou uma fase em que se libertou de si mesmo, explorando novos campos com uma ousadia que talvez muitas bandas não consigam experimentar, sem medo de se reinventar, o que foi um soco no estômago para os fãs mais conservadores.
Um belo disco, extremamente atual, mesmo 20 anos depois.
Disco perfeito
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